segunda-feira, dezembro 01, 2008

Medos e preguiça do atual jornalismo

O jornalismo fica em uma área que inevitavelmente sempre se confundiu com a produção literária, em toda sua história. Porém, com a profissionalização da profissão e a ‘mecanização’ da produção para melhor atender a um sistema de massa, o conteúdo jornalístico, principalmente da grande mídia, foi se tornando mais e mais maçante e fria, com o lado humano cada vez mais deixado de lado. Não é necessário ser um entendido para saber que a paixão pelo jornalismo e pelo que acontece de fato, sem grilhões com o patrão ou com o anunciante, foram substituídos pelo rabo preso e o pensamento pequeno burguês politicamente correto, onde o jornalista se torna um mero voyeur, um brinquedo na mão do inescrupuloso patrão titereiro.

Alguns veículos que se destacaram na mídia conseguiram romper com o convencionalismo, produzindo assim peças de importância fundamental para a classe no Brasil, cobrindo assuntos de um modo que apenas com a liberdade dada por estes, que deram margem à criatividade de seus escritores, conseguiria ser feito um trabalho tão completo. Como grandes exemplos, a revista Cruzeiro e o Jornal da Tarde. A Cruzeiro, da década de 50, chegou a atingir a tiragem de 800 mil exemplares, que, principalmente para a época, é algo estrondoso. Tamanha façanha apenas foi novamente alcançada nos anos 80, com a revista Veja. Ao contrário da última, a revista Cruzeiro contava com a habilidade de seus repórteres, dando-lhe meses para cobrir apenas um assunto, da maneira que mais o convinha, sem seguir formas rígidas.

O Jornal da Tarde, veículo vespertino, também quebrava com essas normas, dando destaque ao lado humano, focando nas pessoas do que realmente nos fatos, revertendo a ordem que geralmente é a comum, nas quais as pessoas envolvidas em acontecidos são apenas detalhes, não peças chave. Infelizmente esse descaso com os fatos trazia algumas conseqüências, pois por vezes o jornal nem sempre trazia o que lhe era devido, carecendo de mais dados concretos sobre determinado assunto.

Há, quanto a utilização ou não de normas rígidas e desse estilo convencional e deficiente de comunicação, grandes bons exemplos, em ambos os extremos. De um lado, a revista Cruzeiro, já mencionada, que quebrou com as regras e consegue um feito estrondoso, já que na época de sua publicação, o país contava com um terço da população atual. Do outro, a atual revista Veja, que é padronizada a um ponto tão alto que o material contido ali parece ser feito pela mesma pessoa, porém a revista com mais alta tiragem no Brasil atualmente. Qual seria o melhor modo de se fazer jornalismo? Pasteurizar a um mingau cinza, frio e insosso ou libertá-lo, voltando a um modelo mais antigo e com provas de ser altamente atrativo quanto à procura, porém praticamente abandonado pelos grandes meios? Experiências passadas provam que ambas formas podem conviver no mesmo espaço, contudo, não há mais veículos de sucesso com essa maior disponibilidade de liberdade e criatividade no mercado atual.

O maior problema de um estilo mais humanista, contudo, é a confusão de que alguns fazem com o populismo. Maior exemplo disso era o Noticias Populares, jornal que “se espremer sai sangue”, segundo dito popular. Com manchetes como o infame “Bebê Diabo”, o jornal trazia noticias de mortes com fotos explicitas, assim como um ensaio sensual pelo menos uma vez por semana. Isso sem contar a cobertura do Carnaval, que fazia o evento fazer jus ao nome de festa da carne.

No meio desses episódios de um modo mais livre de escrita, encontra-se o Gonzo, elevando a níveis estrondosos de absurdo algumas coberturas, com drogas, prostitutas e personagens retratados de maneira sórdida. Confunde-se com literatura, jornalismo e poesia, uma polaroid desfocada de cores turvas retratando temas bizarros. Talvez a vertente que mais faça sentido em um mundo cada dia mais distorcido e tão velozmente metamórfico. Infelizmente, as vezes por um sentimento tacanho, pela ignorância ou pela simples falta de estomago, é um tipo de material ainda um tanto obscuro e com poucos representantes, tanto no Brasil quanto no mundo.

No Brasil, o redator da revista TRIP, Arthur Veríssimo, merece o título de maior expoente do Gonzo. Tendo escrito sobre viagens atravessando o país, viagens para Índia e outros temas que demandam de uma grande bagagem pessoal e uma visão ácida, o repórter faz jus à posição.

Quanto ao futuro do jornalismo brasileiro, há dois pensamentos: o do menor esforço, que resiste em seu conservadorismo, e o intelectual, que demanda maiores e melhores obras. Vamos torcer para que o inevitável aconteça logo, trazendo consigo bons ventos de um jornalismo sem medo.


R. Darci

Um comentário:

  1. muito bom. sou fã do jornalismo gonzo e espero ver mas expoentes deste estilo aqui no Brasil...

    abraços!

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