quinta-feira, setembro 17, 2009

O carro do Brás

Todas as quintas, o colega Ciro Hamen, do Acento Negativo, escreve crônicas sobre a cidade pra Action. Depois de um período de férias, o cara tá de volta. Hoje, sua décima oitava crônica.

Brás se preparava para ter aquela bela noite de sono, depois de uma bela noite de bebedeira. Puxou o lençol e se cobriu.

- Caralho. Meu carro!

Lembrou que não chegou em casa com o seu carro. Saltou da cama, desesperado. Tentava se lembrar da última vez em que tinha visto o automóvel. Correu até o quarto de seu pai.

- Pai! Acorda! Pai!!

- Caralho. O que foi?!

- Eu esqueci o meu carro na fila da balsa.

- O quê?!?

- Eu esqueci o meu carro na fila da balsa.

O pai achou que o filho não estava falando coisa com coisa.

- Você está bêbado. Vai dormir.

Aos poucos, Brás começava a lembrar do que tinha acontecido. Antes de pegar a balsa que o levaria de Santos a Guarujá, resolveu descer do carro, enquanto estava na fila, para vomitar. Tinha bebido demais e comido de menos. Vomitou até a alma. Tão louco, entrou na balsa a pé e caminhou até a sua casa, já do outro lado do oceano. Não lembrava se tinha vomitado na água durante o percurso na embarcação. Enquanto isso, o carro estava em Santos, com a porta aberta e a chave no contato.

- Como eu fui fazer isso? – pensou.

O pai só acreditou quando viu que o carro realmente não estava na garagem.

Tinha todos os motivos para não acreditar. Brás sempre fora um anti-herói. Desde o dia em que engoliu um pirulito inteiro na escola e teve que ser levado ao hospital pela professora, ele tinha se transformado em um garoto perturbado. Às vezes contava histórias que ninguém acreditava. Essa do carro poderia muito bem ser uma delas.

- Caralho. Como você foi fazer isso? – perguntou o pai, enquanto ligava o seu carro para ir buscar o do filho, que tinha ficado do outro lado do oceano.

Brás também não acreditava na merda que tinha acontecido.

- Você vai ter muita sorte se essa merda ainda estiver lá.

Enquanto faziam o trajeto de balsa, Brás tentava se lembrar do que tinha acontecido. Tinha vomitado na água? Não lembrava.

Finalmente chegaram a Santos.

O carro não estava no lugar onde ele havia deixado.

- Fudeu.

- Onde estava o carro?

- Estava aqui.

O pai colocou as mãos sobre o rosto, não acreditando no que tinha acontecido. Sentou no meio-fio e começou a chorar.

- Calma, pai.

- Como calma, porra?!?

De repente, Brás viu um veículo familiar. Estava parado do outro lado da fila e com um sujeito encostado do lado de fora. Brás reconheceu. Era mesmo o seu carro.

- Esse carro é seu?

- Sim. É meu! Onde estava?

- Parado ali.

- Nossa, obrigado.

- Meu, você teve sorte. O ladrão desse carro estava tão doido que saiu pra vomitar e não voltou mais.

Ciro Hamen é jornalista, escreve diariamente sobre cinema no blog www.acentonegativo.blogspot.com e todas as quintas-feiras no Coletivo Action.

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